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Três Batidas

  • Foto do escritor: Mateus Santos
    Mateus Santos
  • 4 de abr. de 2021
  • 2 min de leitura


Knock, knock, knock. O espaço é tomado por um som parecido com este quando o objeto quebra o silêncio que comanda o local, em um movimento repetitivo, remetendo a uma parede oca em que alguém bate insistentemente. Sua cor, o vermelho vivo com centenas de pontos pretos de sujeira adquiridos ao longo do tempo, deveria se destacar — principalmente em quadras brasileiras, considerando que não faz parte do esporte dominante ou pelo menos o mais conhecido — mas a demasiada utilização do objeto tornou as cores mais cinzas e menos chamativas. As adjacências, que dão maleabilidade às mãos e estabilidade na hora de algum lançamento ou arremesso, ainda estão presentes, mas também sentem o peso do tempo, parecendo mais com linhas pretas meramente apagadas como uma forma de estilo do que cumprindo seu propósito inicial de auxiliar o jogador a segurar melhor o objeto.


Knock, knock, knock. Aos olhos nus, essas marcas de desgaste do tempo só remetem à ideia de que talvez seja a hora de substituir tal item por um novo, mais eficiente e funcional. Mas, bem lá no fundo, as marcas têm muito mais significado e ultrapassam o sentido do esporte. Na verdade, servem como metáfora para o dono: assim como as batidas, os passes e os arremessos — tanto os certos como os errados — tornaram o objeto mais antigo e concomitantemente mais resistente, o mesmo se deu com o proprietário do item. Os pontos negros de sujeira, as oito linhas de borracha separando o couro e os símbolos da marca — agora apenas reminiscências — fazem parte da história de evolução do objeto e também da vida do dono.


Knock, knock, knock. Este exemplar detesta a água — e, consequentemente, dias de chuva. Os efeitos da exposição a tais são visíveis no couro surrado e descascado, parecendo a pele de alguém depois de ficar a tarde inteira sob o sol no litoral de São Paulo em uma tarde de verão. Em uma das separações das linhas de borracha feitas na fabricação do objeto, a câmara de butil — local onde uma bomba deve ser inserida a fim de encher o item — jaz destruída pelos constantes enchimentos que já vivenciou e agora parece uma crosta estragada.


Por fim, o couro áspero às mãos é basicamente o resultado de demasiada exposição ao sol em tardes de veraneio com poucas nuvens. Em diversos pontos, é possível observar o material interior — o que não deveria acontecer — enquanto o couro parece uma casca de machucado em que a pessoa mexeu exageradamente, pendendo para fora. O delineamento da borracha também pende um pouco, pedindo para ser arrancado fora — mas ainda assim resistindo. Mas, mesmo com todas as incongruências, o couro surrado, as cores acinzentadas e a aspereza do objeto como um todo, no fim das contas, essa bola segue sendo mais do que uma bola. É um escape. Um sentimento. Uma salvação?


Knock, knock, knockout.

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©2021 por Mateus L. P. Santos

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